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MTV...

Num reality show.

Uma miúda americana passa por aquele cliché de não ser aceite pelos colegas da secundária. É boa aluna, é gozada pelas pessoas populares, e não tem amigos nem pretendentes. No entanto, a MTV vai resolver o problema dela. A chave para se ser respeitado naquela escola é, aparentemente, fazer aquilo que todos os miúdos populares fazem: praticar wakeboard no rio da vila. Portanto a MTV vai ensinar a miúda a ser wakeboarder. Há o instrutor jovem e dinâmico, o ambiente animado, e a banda sonora sentimentalona. A miúda vai alimentando expectativas, no meio de quedas e falsos ensaios nos treinos. Finalmente, o ambiente geral vai mudando. A miúda começa a ser abordada pelas colegas que antes a ostracizavam, e até é convidada para um encontro pelo rapaz mais popular da escola. Nenhuma destas pessoas parece particularmente entusiasmada por se aproximar da rapariga. Dir-se-ia até que foram pagas pela MTV para o fazer. Ou que são pobres alminhas à procura de dez segundos de primetime. Mas isso até se torna pouco relevante no meio de tanto artificialismo.

Finalmente, a miúda começa a dominar o novo desporto e, logo, a tornar-se conhecida. Simultaneamente, altera o look, e chega a uma importante conclusão existencial: ela era mal-tratada pelos colegas porque não era sociável o suficiente, e porque se fechava nela própria. A culpa estava dentro dela, e a reacção do mundo era apenas natural e justificada. Que tal isto como demonstração do síndroma de Estocolmo?

De qualquer das maneiras, as últimas imagens mostram-nos a felicidade estampada na cara da cachopa enquanto festeja com as novas amigas e amigos. É uma rapariga mudada e a caminho da popularidade – pelo menos enquanto as câmaras da MTV lá estiverem.

Sim, eu vi uns vinte minutos disto sem mudar de canal. É uma proeza que não me lembro de alguma vez ter conseguido com mais nenhum reality show. Dito isto, é-me difícil encontrar coisa mais redutora do potencial humano. O que a MTV faz neste programa é dizer a milhões de jovens pelo mundo inteiro que, se são tratados abaixo de cão pelos outros, então devem procurar agradar-lhes o máximo possível, pela adopção do artificialismo estiloso que estiver mais à mão. A individualidade dá trabalho; junta-te à massa acéfala e serás feliz. É neurótico e neuroticizante. Numa palavra: irresponsável.